"A energia que se desperdiça extravagantemente na infância, uma energia que se julga inesgotável, havia desaparecido em algum ponto, entre os 18 e os 24 anos, sendo substituída por algo muito mais insípido, tão artificial como a euforia da coca: propósitos, talvez, ou objetivos, qualquer palavra oca da Câmara de Comércio Júnior que se queira usar. Não era uma grande coisa: aquiolo não chegava de repente, como um estalo. Talvez seja essa a parte assustadora, pensou Richie. Ninguém pára de ser criança subitamente, como um estouro explosivo, como um daqueles enganosos balões do palhaço, com suas inscrições baratas. A criança dentro de nós apenas se escoa, como o ar escpando de um pneu. um dia, ao olhar no espelho, vemos um adulto que nos fita. podemos continuar usando blue jeans, podemos continuar indo a concertos de Springsteen e Seger, podemos tingir os cabelos, mas ainda assim aquele rosto no espelho é o de um adulto. Tudo aconteceu enquanto dormíamos, talvez como uma visita da Fada do Dente."
Stephen King, It, 1985.
Li esse livro essa semana (comecei segunda e terminei ontem, 749 páginas em letra 10! O.O ) e achei esse parágrafo muito interessante. Talvez porque tenha andando pensando na infância, no passado, em pessoas que passaram pela vida, no meu pai... num dos dias da greve estava ouvindo Sérgio Reis e desatei a chorar pensando nele (dia 27 faz três anos que ele morreu). E andei pensando em varias coisas desde então, em coisa, pessoas da infância, da adolescência... principalmente pessoas. Muita gente fala do Orkut, que é legal pra reencontrar gente que fez parte da sua vida, mas levando-se em conta que a maioria das que eu queria manter contato eu tentei, e elas é que sumiram, não sei se valeria a pena. Mas o fato de determinadas pessoas não terem mais contato comigo não significa que eu as tenha apagado da minha vida ou da minha memória. A presença delas simplesmente se evaiu, se escoou, assim como a infância no texto aí de cima. Assim como a crença de que tudo seria sempre legal, de que tudo sempre daria certo, de que seríamos ricos e legais e teríamos tudo que quiséssemos quando adultos... acho que a crença na VIDA se escoou. Quando a gente é criança, se sente disposto a enfrentar qualquer coisa, e se acredita capaz de enfrentar qualquer coisa, o que é muito peculiar. Ainda não temos todo o peso do limite que tentam nos impôr, e da falta de confiança em si próprios, de tanto que ouvimos "você não vai conseguir", "você é muito novo pra isso", "você é muito velho pra isso", "isso não é pra gente como você". Acho que essas são as frases que mais desestimulam alguém que está começando a viver,a tomar percepção de si mesmo inserido no mundo, e do mundo que o cerca. Agora, um pouquinho pior do que isso, é aquela básica do "eu te avisei", quando não conseguimos algo a que nos propomos. Acho que ouvir isso é uma das coisas mais desestimulantes que podem acontecer. Acho que a pior perda no fim da infância não são os amigos, mudar de escola, deixar os brinquedos e brincadeiras para trás por estar "muito grande pra essas coisas", nada disso. Acho que a pior perda da infância é você deixar de acrediar que pode ser o que quiser, que pode fazer o que quiser. Deixar de acreditar em si mesmo. Se eu pudesse voltar e dizer alguma coisa pra Vanessa de quinze anos atrás, seria pra ela nunca acreditar nas pessoas que quisessem desestimulá-la. Porque se ela acreditar em si mesma e tentar, mesmo que não consiga, terá muito menos arrependimentos de coisas que não fez ou sequer tentou, porque a fizeram acreditar que não podia.
Não me perguntem porque essa divagação toda, não faço a menor idéia.
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Laurelin Corsets às 10/16/2005 03:00:00 PM